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Estado de São Paulo cria novo ‘gatilho’ para reajustar água

Incentivo ao aumento de consumo é um absurdo, mas é "necessário" dar dinheiro para os investidores mesmo que isso leve a falta de água para a população. Gestão voltada ao lucro apenas. (Nota do Observatório)



Regra da Arsesp prevê aumento automático de preço quando houver redução expressiva da demanda
          
Fabio Leite, O Estado de S.Paulo

03 Março 2018 | 03h00

SÃO PAULO - A Agência Reguladora de Saneamento e Energia de São Paulo (Arsesp) decidiu criar um “gatilho” para reajustar automaticamente a tarifa de água e esgoto da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) quando houver uma “variação anormal” do consumo médio de água da rede, como ocorreu durante a crise hídrica (2014-2015). Na prática, se a população reduzir muito o consumo e isso tiver efeito negativo nas receitas da Sabesp, a conta de água vai subir além da correção pela inflação. 

Segundo a Arsesp, o objetivo da nova regra - inédita no setor de saneamento do País - é “garantir o equilíbrio econômico-financeiro” da Sabesp, que opera em 367 cidades paulistas (57% do total), onde vivem 24,7 milhões de pessoas. O “gatilho” vai considerar o consumo do sistema como um todo, e não de um imóvel específico. 

O mecanismo, ainda segundo a agência, vai valer “nos dois sentidos”. Ou seja, se houver um aumento significativo do consumo médio de água que leve a uma alta expressiva de arrecadação da Sabesp, a tarifa será reajustada para baixo.

O índice que vai acionar o “gatilho” do reajuste automático ainda está sendo analisado pelos técnicos da agência e deve ser divulgado somente em maio, quando o órgão estadual deve concluir o processo de revisão tarifária da Sabesp e anunciar as novas tarifas de água e esgoto em São Paulo. O cálculo será feito com base na média móvel de consumo de 12 meses (de março de 2017 e fevereiro de 2018, por exemplo) na comparação com os 12 meses anteriores. 

O Estado apurou que a Sabesp propôs que o gatilho seja acionado quando a variação do consumo for maior do que 10%. Hoje, segundo a companhia, o consumo médio de água por imóvel em São Paulo é de 11,5 mil litros por mês. Em sua proposta, a empresa sugere que o reajuste automático ocorra caso esse índice caia para 10 mil ou suba para 13 mil. Procuradas, a Sabesp e a Secretaria de Saneamento e Recursos Hídricos não quiseram se manifestar.

“Quando cai o consumo, a concessionária tem menos água para cobrar e, consequentemente, perde receita. Mas ela já investiu na ampliação e manutenção do sistema para atender a uma demanda projetada. Para equilibrar isso, a tarifa tem de subir”, afirma José Bonifácio de Souza Amaral Filho, diretor de Regulação Econômico-Financeira da Arsesp. “Ainda estamos estudando o índice do gatilho. Tem de ser um número de impacto. Não vamos mexer na tarifa por uma variação pequena de consumo”, completa. 

Espero que não estejamos entrando em outra (crise hídrica). Mas, se tiver uma nova, pode ter aumento.
José Bonifácio de Souza Amaral Filho, diretor de Regulação Econômico-Financeira e de Mercados da Arsesp
Crise

A ideia do gatilho surgiu após a crise de abastecimento na Grande São Paulo entre 2014 e 2015 por causa da seca no Sistema Cantareira, principal manancial paulista. Depois de ver seu lucro encolher 53% ao fim do primeiro ano da crise, a Sabesp solicitou à agência um reajuste extraordinário na conta de água e esgoto para compensar os efeitos da queda de 20% no consumo. À época, a companhia praticava uma política de desconto e multa para incentivar a economia de água e fazia racionamento na rede.

Em junho de 2015, a Arsesp aprovou uma reajuste extraordinário de 15,24% nas contas - o maior desde 2003 -, dos quais 6,91% eram referentes à queda de consumo de água e ao aumento do custo da energia elétrica, ambos decorrentes da estiagem, e 7,78% de correção inflacionária. No trimestre seguinte ao reajuste extraordinário, o lucro da Sabesp subiu 11,5%. Em 2016, primeiro ano pós-crise, os ganhos da companhia já ultrapassavam os valores pré-crise.

Agora, a Arsesp quer implementar o “gatilho” para agilizar o debate sobre o reequilíbrio econômico da Sabesp em eventual nova crise. “Com o gatilho não precisamos ficar discutindo se cabe ou não cabe a revisão. Mas não será um reajuste automático. Vamos seguir o rito de consulta pública e avaliar tudo o que foi feito pela concessionário para definir o porcentual de reajuste”, diz Amaral.

Crítica

Para entidades envolvidas com questões ambientais, o gatilho é um “contrassenso” que desestimula o uso racional da água. “Esse mecanismo vai contra todos os conceitos e descobertas científicas que apontam para a necessidade de mudança de paradigma em relação ao consumo de água. É uma inversão total de princípios primordiais para a preservação de recursos hídricos”, critica Guilherme Checco, do Instituto Democracia e Sustentabilidade.

“Parece uma regra feita para beneficiar a empresa e garantir o lucro dos seus acionistas, entre eles o governo do Estado, em vez de estimular o uso racional da água”, afirma Marússia Whately, coordenadora da Aliança pela Água, articulação que envolve uma serie de organizações em defesa da água.

Vítima de racionamento de água durante a crise hídrica, a aposentada Maria da Graça Nogueira, de 60 anos, diz não ser justo que o preço da água aumente caso haja uma nova crise. “É um absurdo. Sempre sobra para a gente”, reclama. Desde 2014, quando a crise foi deflagrada, a conta de água e esgoto da aposentada, que sempre consumiu o valor mínimo, subiu 43,6%, passando de R$ 33,64 para R$ 48,30.

Estado inaugura nesta sábado obra de transposição

Dois anos após o fim declarado da crise hídrica paulista, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) inaugura neste sábado, 3, em Nazaré Paulista, interior de São Paulo, a obra de transposição de água Jaguari-Atibainha, considerada essencial para socorrer o Sistema Cantareira em caso de uma nova seca extrema no principal manancial paulista. 

A obra vai levar 5,1 mil litros por segundo - 8% do volume de água consumido na Grande São Paulo - da represa Jaguari, que integra a bacia do Rio Paraíba do Sul, para a represa Atibainha, do Sistema Cantareira. A construção teve início em 2016 e custou R$ 555 milhões. 

A obra foi anunciada por Alckmin ainda em 2014, primeiro ano da crise, com conclusão prevista para o fim do ano seguinte. Mas o projeto provocou uma disputa com o governo do Rio, que capta água do Rio Paraíba para abastecer a população fluminense. Após acordo homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ainda em 2015, a obra teve início no ano seguinte, quando o próprio governador já havia anunciado o término da crise de abastecimento na Grande São Paulo.

Segundo a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp), responsável pela obra, a transposição aumenta a segurança hídrica para o abastecimento de água das regiões metropolitanas de São Paulo e Campinas pelos próximos anos. Dados da estatal apontam que a chance de o Cantareira receber por mês um volume de água insuficiente para atender a demanda cairá de 6,7% para 0,4% com a inauguração da obra. 

O acordo com o governo do Rio para liberar a transposição prevê que o bombeamento da água seja feito nos dois sentidos. Ou seja, quando for preciso, a Sabesp poderá mandar água do Cantareira para a represa Jaguari, no Vale do Paraíba. Nesse sentido, a transposição vai bombear até 12,2 mil litros por segundo. Essa parte da obra ainda não foi concluída e deve ser entregue até o fim deste mês, segundo a gestão Geraldo Alckmin.

Produção

Hoje, a Sabesp produz 60,9 mil litros por segundo para atender a 21 milhões de pessoas na Grande São Paulo. Há quatro anos, a demanda era de 71,4 mil litros por segundo.
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